Torcer para um clube de futebol, especialmente no Brasil, é algo que transcende os limites do normal. Casos já relatados mostram uma paixão anormal, até inexplicável. Há o torcedor com mais condições que não hesita em ir ao estádio todo santo jogo, ocupando seu camarote ou indo às sociais. Há também aquele mais humilde que, de tão apaixonado, chega ao ponto de tirar o dinheiro da própria comida para ver seu time jogar e gritar o gol do seu ídolo.
Diz-se por aí que o futebol é algo pouquíssimo importante para se dispensar tamanha atenção. Nesse caso, o aficcionado pelo esporte pode responder com um ‘o Sacchi tem razão’*. O torcedor não se preocupa com o que aparenta, vai exatamente na contramão disso, por vezes fazendo questão de exaltar sua imagem de apaixonado.
Sampaio Corrêa, Paysandu, Remo, Fortaleza e Santa Cruz. O que todos têm em comum é um dos objetivos deste texto. A saber:
Paixão em muitas cores: O Sampaio Corrêa, carinhosamente chamado de ‘Bolívia’ pelos seus torcedores por causa das cores, passou por uma longa e agreste fase, porém acaba de se garantir na 3ª divisão do Campeonato Brasileiro de 2013 com bela campanha e grandes públicos. Foi de se encher os olhos.
Busca pela hegemonia: O Tricolor do Pici, em meados da década passada, era dono de uma supremacia em seu estado, panorama favorecido por um mau momento do eterno rival, o Ceará. Ter sido multicampeão estadual e algumas participações na Série A do Brasileirão ratificaram esse status. Porém, já no final dos anos 2000, o Vozão deu uma guinada e conseguiu reverter a situação, e o Leão caiu pelas tabelas. Este retornou, inclusive, à 3ª divisão. Após passar por uns momentos difíceis, até mesmo financeiros, o Fortaleza parece estar se reabilitando. Formou um time forte para o Brasileiro 2012 e fatalmente conseguirá o acesso, com o apoio da fanática torcida, que tem enchido o Presidente Vargas toda partida.
Rivais de mãos dadas: Os dois grandes clubes da capital do Pará são adversários ferrenhos, embora a rivalidade tenha esfriado, fato associado talvez à queda do poderio de ambos em relação ao que apresentavam anteriormente no cenário nacional. Ao realizar uma bela campanha na Libertadores da América de 2003, até mesmo vencendo o temido Boca Juniors em plena La Bombonera, parecia que o Paysandu levaria o futebol paraense a outro nível, quem sabe se equiparando a centros mais desenvolvidos no país. O que se viu, entretanto, foi uma decadência rápida. Após isso, o Papão fez companhia ao coirmão no fundo do poço, ficando sem divisão e passando necessidade ao tentar sanar os próprios cofres. Contudo, o time bicolor em 2012 tomou nova cara após a lastimável campanha no campeonato paraense, humilhou o Sport na Copa do Brasil e também está firme na briga por uma vaga na Série B de 2013, com a força de um estádio Leônidas de Castro sempre cheio. O Remo, em estado ainda pior, ainda respira por aparelhos, mas os fieis adeptos do Leão Azul permanecem ao seu lado e lutado em busca da volta dos dias de glória, constituindo a maior média de público do Parazão em 2012 e fazendo jus ao apelido de ‘O Mais Querido de Belém’. Os 12 anos sem disputar a Série A e os 5 sem participar da B, além de desde 2008 não participar do nacional, aparentemente criaram um vínculo maior com os torcedores.
Corais contam com a força do seu estádio: O Tricolor é um dos clubes mais tradicionais do estado de Pernambuco e do Nordeste. É conhecido também por ser protagonista de uma das maiores decadências do futebol brasileiro: a queda sucessiva da elite do Campeonato Brasileiro até a lama da Série D. A ‘escada’ tomada pelo Santa foi a todo tempo motivo e inspiração para chacotas feitas pelos seus adversários locais, que voltavam a um melhor momento no futebol nacional. Apesar disso, a massa coral não abandonou seu time, e passou a lotar o estádio do Arruda nos jogos da Quarta (e agora da Terceira) divisão. A situação na Série C é idêntica à do Paysandu e, por ser o time mais tradicional e com mais dinheiro da competição, pode ser uma boa aposta para o acesso, pois tem chegada e o apoio das arquibancadas.
Sem querer exultar muito ou ficar comparando, as torcidas do Norte e do Nordeste dão um show à parte no quesito paixão e fazem belas festas nos estádios, enquanto boa parte das do Sudeste têm decepcionado. Isso é notório. O que não se costuma perceber de primeira é: por quais motivos times com menor expressão levam tanta gente aos estádios? Fica somente o julgamento de uma torcida apaixonada e só. Não pretendendo desmerecer ninguém, mas em determinados casos, as circunstâncias colaboraram. Quantidade menor de jogos, ingressos mais baratos, viagens mais curtas. Tudo isto favoreceu a imagem dos torcedores dessas agremiações.
Está longe de ser algo recriminável, até mesmo porque o poder aquisitivo de tais clubes é muito mais reduzido em relação aos médios e grandes do Sul/Sudeste, então esses públicos gigantes são necessários (assim como para qualquer outro) e dignos de aplausos e admiração, apesar das ressalvas.
*Arrigo Sacchi, ex-treinador italiano. Famoso, além de outros motivos, por ter proferido a clássica frase “O futebol é a coisa mais importante dentre as menos importantes”.